terça-feira, 15 de maio de 2012

Mães da Ocupação Eliana Silva


Esses dias tive o privilégio de poder participar um pouquinho da construção da comunidade Eliana Silva. Uma comunidade que se construiu e fortaleceu a cada dia de ocupação em um terreno abandonado há mais de 40 anos na região do Barreiro em Belo Horizonte.

Esse terreno servia de lixão, local para o tráfico de drogas, desmonte de carros roubados e desova de cadáveres. Até que na madrugada do dia 21 de abril mais de 300 famílias ocuparam o terreno e começaram a dar vida ao lugar. O primeiro passo foi limpar e organizar o espaço. Depois construir as barracas, de lona ainda, mas já um esboço de pequenas casas. O senso de comunidade foi crescendo, construíram uma cozinha e uma creche comunitária. Em poucos dias a solidariedade dentro e fora da ocupação garantia que ninguém passasse fome. Com a pequena creche algumas mulheres puderam voltar ao trabalho, tendo onde deixar seus filhos pequenos.

Cheguei na ocupação com o intuito de mostrar minha solidariedade e ajudar na organização da saúde. Junto com estudantes da área da saúde começamos um questionário com as famílias para levantar as principais demandas. Esses dados serviriam de informação para uma Audiência Publica prometida pela juíza, para uma reunião com o Centro de Saúde da área de abrangência e para planejar ações que pudessem empoderar aquela população em sua saúde.

Infelizmente nada disso aconteceu. Sem nenhum tipo de diálogo, desconsiderando as questões legais que de que a prefeitura não havia comprovado posse do terreno, a Juíza Doutora Luzia ordenou a reintegração de posse. A ação da polícia ocorreu sem aviso prévio, na madrugada do dia 11 de maio. Mais de 400 policiais intimidaram os 1500 moradores e funcionários da prefeitura de Belo Horizonte, cumpriram, constrangidos, as ordens de colocar em pilhas de escombros os poucos pertences dessas famílias.

O que tudo isso tem a ver com nosso blog sobre gravidez, maternidade e infância?

É simples. A maioria desses 1500 moradores eram mulheres. Mulheres mães e gestantes. Encontramos mais de 30 crianças com a idade de 0 a 1 ano. Muitas mais se contarmos até os 15 anos. E ainda três gestantes e outras mulheres que suspeitavam de gravidez.

E dois dias antes do Dia das Mães essas mulheres são brutalmente despejadas das pequenas casas que conseguiram construir. Do lar que encontraram naquela comunidade que se formava.

Acredito que todas as mães que acompanham o blog podem afirmar que uma de suas prioridades é construir um lar seguro para seus filhos. Era isso que essas mulheres estavam fazendo, mas foi destruído sem nem mesmo uma conversa.


Sem considerar os interesses políticos e econômicos de quem exigiu e ordenou a desocupação fico pensando que essas pessoas o fizeram antes de abrir qualquer tipo de diálogo com a população para que não tivesse o risco de se compadecerem com as histórias das famílias.

Não é difícil imaginar que para que uma mãe tome a decisão de morar debaixo de uma barraca de lona com seus filhos que sua situação anterior era muito pior. Com certeza ela já considerou todas as suas outras opções e essa foi a mais segura para a sua família. Então, como não ouvir essas mães na sua luta para garantir um lar para sua família?

Quem conhece cada uma daquelas famílias não tem como não se sensibilizar e se envolver com a luta. Não pode fica indiferente a pequena Alice Sofia, que mesmo com febre estende os braços pedindo colo de quem apareceu para conversar com a mãe. Sua mãe, segurando um bonito prato de comida, farto, com feijão tropeiro e macarrão, contava como administrava o antibiótico recomendado, que estava mantendo a filha hidratada e oferecendo o peito em livre demanda. Richard precisava de um complemento para o remédio da asma. A mãe explicou pacientemente como o seu pulmãozinho funcionava e que o remédio tinha acabado. Mantinha o colchão em que dormiam todos da família limpo e arejado, mas ali, no chão de terra, seria preciso conseguir um berço para que o pequeno não tivesse mais uma crise.

Crianças especiais encontramos em todos os lugares. Mas talvez Tamires, uma adolescente com Síndrome de Down, e Franciele, uma pré adolescente com deficiência metal, seja mais especiais ainda. Acompanhavam a assembleia com atenção e participavam dos gritos de ordem! Com transparência e honestidade relatavam a todos o seu dia a dia, mostrando como estavam bem cuidadas, e com abraços retribuíam o carinho que recebiam da comunidade.

Outras várias crianças especiais ali. Especiais porque atentas aprendiam a construir coletivamente um lar, com uma infância segura. Era isso que Cristina passava a seus dois filhos, com exemplo de uma participação ativa e engajada na luta pelo seu direito a moradia.

A ocupação Eliana Silva continua mobilizada e todo o apoio é necessário! Vamos apoiar essas mães na sua luta pelo direito a moradia. Vamos dizer ao prefeito Marcio Lacerda que ele não tem o direito de despejar essas famílias e fechar os olhos para a realidade desses belorizontinos. Vamos dizer sabendo que essas mães não queria estar com suas famílias debaixo de barracas de lonas e sim em moradias dignas, e é isso que o prefeito tem o dever de prover.


“ENQUANTO A MORADIA FOR UM PRIVILÉGIO, OCUPAR SERÁ UM DIREITO”

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