sábado, 5 de março de 2011

"Era uma vez..."


Quem lê "Cinderela" não imagina que há registros de que essa história já era contada na China, durante o século IX d.C.. E, assim como tantas outras, tem-se perpetuado há milênios, atravessando toda a força e a perenidade do folclore dos povos, sobretudo, através da tradição oral.

Pode-se dizer que os contos de fadas, na versão literária, atualizam ou reinterpretam, em suas variantes questões universais, como os conflitos do poder e a formação dos valores, misturando realidade e fantasia, no clima do "Era uma vez...".

Por lidarem com conteúdos da sabedoria popular, conteúdos essenciais da condição humana, é que esses contos de fadas são importantes, perpetuando-se até hoje. Neles encontramos o amor, os medos, as dificuldades de ser criança, as carências (materiais e afetivas), as auto-descobertas, as perdas, as buscas, a solidão e o encontro.

Os contos de fadas caracterizam-se pela presença do elemento "fada". Etimologicamente, a palavra fada vem do latim fatum (destino, fatalidade, oráculo). Tornaram-se conhecidas como seres fantásticos ou imaginários, de grande beleza, que se apresentavam sob forma de mulher. Dotadas de virtudes e poderes sobrenaturais, interferem na vida dos homens, para auxiliá-los em situações-limite, quando já nenhuma solução natural seria possível. Podem, ainda, encarnar o Mal e apresentarem-se como o avesso da imagem anterior, isto é, como bruxas.

O enredo básico dos contos de fadas expressa os obstáculos, ou provas, que precisam ser vencidas, como um verdadeiro ritual de iniciação, para que o herói alcance sua auto-realização existencial, seja pelo encontro de seu verdadeiro "eu", seja pelo encontro da princesa, que encarna o ideal a ser alcançado.


Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)

quinta-feira, 3 de março de 2011

As Crianças e a Fábula


O termo fábula origina do latim - fari - falar e do grego - Phao - contar algo. A fábula é uma narrativa (de natureza simbólica) de uma situação vivida por animais, que alude a uma situação humana e tem por objetivo transmitir certa moralidade. A apresentação de uma exemplaridade espelha a moralidade social da época. Essa moral é fechada, inquestionável. A não-mudança implementada pelas fábulas retrata uma preocupação com a manutenção da ordem estabelecida. Oferece, então, um modelo de comportamento maniqueísta; onde o "certo" deve ser copiado e o "errado", evitado.


Este tipo de texto já aparece no século XVIII a.C., na Suméria. Nascido no Oriente, vai ser reinventado no Ocidente pelo grego Esopo (Séc. V a.C.) e aperfeiçoado, séculos mais tarde, pelo escravo romano Fedro (Séc. I a.C.) que o enriqueceu estilisticamente. Entretanto, somente no século X, começaram a ser conhecidas as fábulas latinas de Fedro.

Ao francês Jean La Fontaine (1621/1692) coube o mérito de dar a forma definitiva a uma das espécies literárias mais resistentes ao desgaste dos tempos: a fábula, introduzindo-a definitivamente na literatura ocidental. Embora escrevendo para adultos, La Fontaine tem sido leitura obrigatória para crianças de todo mundo. 

Na fábula, a presença dos animais deve-se, sobretudo, ao convívio mais efetivo entre homens e animais naquela época. O uso constante da natureza e dos animais para a alegorização da existência humana aproximam o público das "moralidades". Assim apresentam similaridade com a proposta das parábolas bíblicas.

Algumas associações entre animais e características humanas, feitas pelas fábulas, mantiveram-se fixas em várias histórias e permanecem até os dias de hoje. O leão representa o poder real, a raposa a astúcia e esperteza, o lobo simboliza a dominação do mais forte e o cordeiro a ingenuidade.

A proposta principal da fábula é a fusão de dois elementos: o lúdico e o pedagógico. As histórias, ao mesmo tempo em que distraem o leitor, apresentam as virtudes e os defeitos humanos através de animais. Acreditava-se que a moral, para ser assimilada, precisava da alegria e distração contida na história dos animais, que possuem características humanas. Desta maneira, a aparência de entretenimento camufla a proposta didática presente.

A fabulação ou afabulação é a lição moral apresentada através da narrativa. O epitímio constitui o texto que explicita a moral da fábula, sendo o cerne da transmissão dos valores ideológicos sociais. Podemos citar as fábulas de La Fontaine: "O Lobo e o Cordeiro", "A Raposa e o Esquilo", "Animais Enfermos da Peste", "A Corte do Leão", "O Leão e o Rato", "O Pastor e o Rei", "O Leão, o Lobo e a Raposa", "A Cigarra e a Formiga", "O Leão Doente e a Raposa", "A Corte e o Leão", "Os Funerais da Leoa", "A Leiteira e o Pote de Leite".

Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)

terça-feira, 1 de março de 2011

A NARRATIVA NA LITERATURA INFANTIL



A obra literária para crianças é essencialmente a mesma obra de arte para o adulto. Difere apenas na complexidade da concepção: a obra para crianças será mais simples em seus recursos, mas não menos valiosa. (Cunha, 1995).

Assim como há obras literárias extremamente simples para o adulto (com estrutura linear, tempo cronológico, personagens planas, na obra narrativa) e que são consideradas obras-primas, a literatura infantil também fará uso desses recursos. A simplicidade de concepção também cria a simplicidade de linguagem.

Drummond nos ensina a não confundir o simples com o fácil:
“Certos espíritos dificilmente admitem que uma coisa simples pode ser bela, e menos ainda que uma coisa bela é necessariamente simples, em nada comprometendo a sua simplicidade as operações complexas que foram necessárias para realizá-la. Ignoram que a coisa bela é simples por depuração e não originalmente; que foi preciso eliminar todo o elemento de brilho e sedução formal (coisa espetacular), como todo resíduo sentimental (coisa comovedora), para que somente o essencial permanecesse. E diante da presença do essencial, não percebendo, até mesmo fugindo a ele, o preconceituoso procura o acessório, que não se interessa e foi removido. Mais pura é a obra, e mais complexa a indagação ‘Mas é somente isso? Não há mais nada?’ Havia, mas o gato comeu (e ninguém viu o gato).”

A Narrativa para as Crianças

A narrativa para crianças não dispensa o dramatismo, a movimentação. Irrequieta por natureza, incapaz de uma atenção demorada, a criança irá interessar-se naturalmente pelos livros onde a todo momento apareçam fatos novos e interessantes, cheios de peripécias e situações imprevistas, movimentando-se assim o espírito infantil. (Cunha, 1995).

O autor terá mais sucesso com as crianças se evitar descrições longas, que em geral interrompem o caso. Como lembra Monteiro Lobato: “As narrativas precisam correr a galope, sem nenhum efeito literário.”

Com relação às falas e pensamentos dos personagens o melhor recurso é o discurso direto, como afirma Cunha (1995). É importante a narrativa linear, com tempo cronológico sem cortes ou voltas ao passado.  Para crianças mais novas é essencial o desfecho feliz.

Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)

domingo, 27 de fevereiro de 2011

A Ilustração e o Sentimento

Nas histórias e livros com texto escrito a ilustração tem o seu lugar. A página ganha magia e encantamento. A ilustração ajuda a transportar-nos para o mundo do maravilhoso, chama a atenção do leitor, prendendo-o à história. No entanto temos que tomar cuidado com a caracterização dos personagens. Algumas vezes podemos quebrar o encanto do imaginar a cara de um personagem, outras vezes limitar a imaginação através de uma ilustração.

Abramovich (1989) observou que, nos livros infantis, o ético e o estético são reforçados. A bruxa e o gigante são sempre assustadores. A princesa e o príncipe sempre loiros e bonitos. Padrões estéticos e estereotipados da nossa sociedade.

Nas histórias infantis há espaço para todos os tipos de sentimentos. É assim que a criança, que ainda não consegue separar o sentimento do mundo real do mundo da imaginação, vai conhecê-los e aprender a lidar com eles. Encontramos nas histórias idéias engraçadas, o tédio, o aborrecimento, o mau humor, a irritação, lamentações, queixas, a incompetência adulta, sustos, espantos, verdades, alegrias, prazeres, amor, saudade...

Cada autor aborda o sentimento de uma forma diferente. Monteiro Lobato é mestre na arte de fazer sentir. Todos conhecemos sua personagem Emília, a boneca falante, do Sítio do Pica Pau Amarelo. Emília é faladeira, irreverente, fala o que pensa e sente na hora que quer, gosta e desgosta, manda e desmanda, aprende a lidar com seus sucessos e seus fracassos, chora, ri, sente medo, ciúmes, inveja, saudade, alegria e amor. Com a Emília as crianças aprendem também novas maneiras de enfrentar as mais diferentes situações e conhecem lugares inimagináveis. Conhecer o mundo da Emília é deixar a imaginação correr solta.

O mundo das histórias é vasto e enriquecedor. Uma criança não pode ficar de fora desse mundo. E um adulto, se quiser se manter saudável, sempre criança, não deve nunca se desligar do mundo do maravilhoso. É papel do adulto propiciar às crianças novas experiências de contato com livros e histórias, entrando assim ele mesmo em contato, e garantindo um bom desenvolvimento intelectual e emocional da criança.

Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

A Arte de Contar Histórias

É muito importante que o contador tenha lido antes a história e conheça bem o texto, assim não haverá surpresas. A arte de contar histórias promove o equilíbrio do que é ouvido com o que é sentido. É o uso simples e harmônico da voz!

Ao contar histórias precisamos usar a voz, interpretando cada personagem, transmitir no rosto as emoções do momento e com o corpo prender a atenção de todos, com gestos e contatos individuais. E ouvir histórias não é importante só para aquelas crianças que não sabem ler, é fundamental para todos. É um momento único, o momento da contação, onde se desenvolve a habilidade de prestar atenção, escutar, pensar, ver com os olhos da imaginação, se envolver na história e se apaixonar por ela.


 Outra forma de entrar em contato com a história é através dos livros sem textos. Uma experiência muito importante para as crianças. Precisamos deixar que elas brinquem com os livros, manuseiem. São livros apenas de ilustrações que contam histórias simples e para isso pedem a participação do leitor.

É interessante observar os diferentes materiais de se construir essas histórias. Livros de matérias diferenciados, plástico, pano, papel, com personagens em relevo, algumas vezes que se mexem, outras vezes que acompanham a história até o final. Alguns livros podem ser montados pelas crianças formando cenários como casas, circos e castelos. Outros foram feitos para a criança colorir.

Mesmo sem textos escritos a histórias tem uma narrativa sequenciada e completa. Dá a oportunidade às crianças de oralizar a história, criar seu próprio texto em cima da cena do livro. A narrativa visual, quando bem feita, estimula a criatividade e permite diferentes explorações e criações da criança. Mais uma vez Abramovich (1989), destacando a importância dessa narrativa afirma que esses livros (feitos para crianças pequenas, mas que podem encantar aos de qualquer idade) são, sobretudo, experiências de olhar... De um olhar múltiplo, pois se vê com os olhos do autor e do olhador/leitor, ambos enxergando o mundo e as personagens de modo diferente, conforme percebem esse mundo...

Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O MUNDO DO MARAVILHOSO

Para as crianças a literatura é o mundo do maravilhoso. O pensamento das crianças entra no mundo mágico, através da linguagem das fábulas, mitos e lendas. De acordo com Oliveira (s/d), o maravilhoso sempre foi e continua sendo um dos elementos mais importantes na literatura destinada às crianças. Através do prazer ou das emoções que as estórias lhes proporcionam, o simbolismo que está implícito nas tramas e personagens vai agir em seu inconsciente, atuando pouco a pouco para ajudar a resolver os conflitos interiores normais nessa fase da vida.

As histórias são muito importantes na vida da criança, a ajudam a perceber e entender o mundo a sua volta. O contato com a história e a leitura pode ocorrer de diversas maneiras: oralmente, manuseando um livro, observando gravuras ou lendo um livro.

O primeiro contato da criança com um texto é feito oralmente. Pode começar até mesmo antes dela nascer. É interessante ler para bebês ainda na barriga para que estes conheçam a voz de seus familiares. Podemos observar como os bebês se acalmam no útero enquanto ouvem uma história. Depois disso, escutar uma história ficará ainda mais prazeroso. Podem ser contos de fadas, trechos da Bíblia ou história inventada, tendo a criança e os pais como personagens.

Abramovich (1989) nos mostra que a leitura é prazerosa para o adulto e para a criança e traz novas oportunidades. É através da história e dos seus personagens que a imaginação da criança será suscitada, incentivada a criar perguntas e buscar soluções, descobrirá novas formas de solucionar questões imitando os personagens, novos lugares, novos assuntos, vai rir, sorrir, gargalhar, sentir medo, tristeza, alegria, pavor, insegurança, raiva, bem estar, tranquilidade. É descobrir o mundo e adquirir conhecimento sem ter cara de aula.


Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A IMPORTÂNCIA DAS HISTÓRIAS INFANTIS

Há alguns anos atrás, na faculdade, fiz um trabalho sobre a literatura infantil para uma disciplina. O trabalho foi uma delícia de ser feito e abriu um mundo novo de fantasias. Assim, resolvi transformar-lo em uma série de post sobre a Literatura Infantil.

A cada 2 dias vou colocar um texto novo sobre o assunto! Fico esperando ansiosa o comentário de todos!

Então vamos lá...

É no encontro com qualquer forma de Literatura que os homens têm a oportunidade de ampliar, transformar ou enriquecer sua própria experiência de vida. Nesse sentido, a Literatura apresenta-se não só como veículo de manifestação de cultura, mas também de ideologias.

A Literatura Infantil, por iniciar o homem no mundo literário, deve ser utilizada como instrumento para a sensibilização da consciência, para a expansão da capacidade e interesse de analisar o mundo. Sendo fundamental mostrar que a literatura deve ser encarada, sempre, de modo global e complexo em sua ambigüidade e pluralidade.

Até bem pouco tempo, em nosso século, a Literatura Infantil era considerada como um gênero secundário, e vista pelo adulto como algo pueril (nivelada ao brinquedo) ou útil (forma de entretenimento). A valorização da Literatura Infantil, como formadora de consciência dentro da vida cultural das sociedades, é bem recente.

Para investir na relação entre a interpretação do texto literário e a realidade, não há melhor sugestão do que obras infantis que abordem questões de nosso tempo e problemas universais, inerentes ao ser humano. Não é apenas trazer para o texto um conjunto de temáticas vinculadas, (pobreza, menor abandonado, pais separados, sexo etc.) por contigüidade, ao contexto social no qual se pretende inserir a criança. E sim fazer uma construção plana, previsível, sem surpresas, numa linguagem que tem por tarefa, apenas, ser canal expressivo de valores e de conceitos fundados sobre a realidade social.

"Infantilizar" as crianças não cria cidadãos capazes de interferir na organização de uma sociedade mais consciente e democrática.

“Ah, como é importante para a formação de qualquer criança ouvir muitas, muitas histórias... Escutá-las é o início da aprendizagem para ser um leitor, e ser leitor é ter um caminho absolutamente infinito de descoberta e de compreensão do mundo...”(Abramovich, 1989).

Ah! Aproveito para já agradecer minhas antigas colegas de grupo, hoje fonoaudiólogas super competentes: Fernanda Campos, Camila Alexandra, Bárbara Justo e Ana Paula Gonçalves (daqui a pouco a primeira mamãe do grupo!)

Texto por: Luísa M M Fernandes
(Fonoaudióloga – CRFa 6630 e Doula)