quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

“Parto Frankstein”


Já contei aqui a história de um parto que começa bem, mas por causa de uma série de intervenções desnecessárias acaba terminado em uma cirurgia abdominal, ou seja, uma cesariana. Hoje vou contar a história de um parto normal, também cheio de intervenções desnecessárias e não humanizado. É o que chamamos de “parto frankstein”, mas infelizmente o único que a maioria das mulheres que conseguem parir no Brasil conhecem (já que 52% dos bebês nascem por cesariana no país, isso é, as mulheres não tem a oportunidade de parir.

Nessa história nossa grávida vai se chamar Joana, mas poderia ser Ana, Maria ou Patrícia... Qualquer uma de nós.

A história começa como sempre, uma mulher grávida que conhece pouco sobre o parto. Conhece apenas as cenas de desespero mostradas na televisão e talvez um pouco do relato de sua mãe ou tias. O relato da avó, provavelmente é de parto normal, mas parece algo distante e de outro século, literalmente.

Bom, Joana confia no seu obstetra, mas não terá seu parto com ele, já que para isso teria que pagar uma taxa de disponibilidade, algo entre 1500 a 3000 reais. Ela escolhe então um dos hospitais que seu convênio cobre e é para essa maternidade que vai quando entra em trabalho de parto, para ser atendida pela equipe de plantão.

Joana chega ao hospital sentindo algumas contrações após sua bolsa ter rompido. O marido faz o registro e a internação da esposa.

Assim que entra as enfermeiras começam a preparar Joana. Começam pelo procedimentos de enema e tricotomia. O enema é a lavagem intestinal da mulher com glicerina. A tricotomia é a raspagem com gilete dos pelos pubianos da mulher. Ambos procedimentos desconfortáveis e invasivos para Joana. Ela se sente inibida e constrangida. Mas assume que esses procedimentos são necessários. O que ela não sabe é que esses procedimentos são realizados por conveniência médica, uma vez que já é de conhecimento cientifico que esses procedimentos não beneficiam o parto e que o pelo da mulher ou mesmo suas fezes não contaminam de forma alguma o bebê que esta nascendo.

Logo depois já colocam Joana no soro com ocitocina. Ela fica deitada na cama sem saber muito o que fazer e como poderia diminuir a sua dor. As contrações rapidamente ficam mais rápidas e fortes. Com muita dor Joana pede pela anestesia e recebe uma dose alta de peridural. Com a anestesia as dores passam, mas o trabalho de parto torna-se longo e demorado. Depois de algumas horas Joana já está se sentindo fraca pelo jejum.

Finalmente a dilatação está completa e o bebê começa a descer. Mas Joana está anestesiada e não sente o que está acontecendo. Não percebe a necessidade do seu corpo em fazer força, o puxo.

Joana é então levada ao centro cirúrgico e colocada em posição de Litotomia, deitada com as pernas para cima. As enfermeiras dizem a Joana para não gritar e só fazer força. Força grande, força cumprida! Joana esta exausta e não sabe mais como fazer essa força. Aliás, o que seria mesmo uma força cumprida?

Logo o médico faz uma episiotomia, um corte profundo no períneo de Joana. Esse procedimento é realizado sem o conhecimento ou consentimento de Joana, e apenas para conveniência médica, uma vez que já foi provado cientificamente que a episiotomia de rotina é desnecessária e que, se houver corte, ele cicatrizará melhor se for um corte natural, que segue a fibra muscular do que um corte profundo e reto, realizado pelo médico.

A “passagem” (espaço entre os ossos da bacia) de Joana esta diminuída porque, ao deitar. seu coxis posiciona de forma anterior, diminuindo o espaço. Além disso, deitada a gravidade não auxilia no trabalho de parto. Anestesiada Joana também não consegue fazer mais força. Seu bebê coroa (aparece a ponta da cabeça), mas não nasce. O médico, impaciente, resolve usar o fórceps (instrumento usado para puxar o bebê), sem contar a Joana para não assustá-la. Joana sente muita força e muita pressão. Finalmente o pequeno bebê nasce. Um tanto assustado e um pouco devagar com os efeitos da anestesia.

Joana está emocionada. Não percebe tudo o que acontece a sua volta. O pediatra chama o marido para cortar o cordão umbilical e leva o pequeno bebê para uma incubadora a parte para ser avaliado. Depois de fazer a sua avaliação o pediatra entrega o bebê a Joana e pode encerrar o plantão, uma vez que já fez toda a sua avaliação, pegando o bebê antes da mãe. Avaliações que poderiam ser realizadas depois que a mãe amamentasse, uma vez que o bebê está bem.

Com o filho nos braços Joana pode abraçá-lo e beijá-lo. Um pouco sem jeito, por não poder sair da posição de litotomia, tenta amamentá-lo. Mas o tempo é curto. Não dá tempo de colocá-lo para sugar ou amamentá-lo. Logo a enfermeira vem buscá-lo para levar ao berçário e passar por outros procedimentos, enquanto a mãe recebe os pontos pela episiotomia que sofreu.

Joana só voltará a ver o filho muitas horas depois, possivelmente no dia seguinte se já for noite. Vai para o quarto com o marido, sentindo-se disposta, mas ainda com dor de cabeça por causa da anestesia. Mais tarde, quando seu filho chega ao quarto ele já está dormindo, mas ela sente-se disposta a amamentar, mesmo com poucas explicações da equipe de enfermagem.

Felizmente Joana tem mais condições físicas para amamentar seu filho e já no dia seguinte estará em casa para poder se dedicar exclusivamente a ele. Infelizmente seu parto foi cheio de procedimentos invasivos e desnecessários, quando poderia ter sido muito mais tranquilo, amoroso, sem sofrimento e humanizado. Um parto que propiciaria ela maiores condições ainda de seguir amamentando seu filho.

Conhece histórias como essa?
Nesses casos, quando a mulher relata o tanto que sofreu num parto e que a dor é terrível, fica fácil de entender porque não desejam outros partos vaginais, já que de normal esse não teve nada.

Todos estão bem, mas o desejo de algo melhor permanece, o desejo de que Joana possa um dia ser a dona de seu próximo parto, sem tantas intervenções desnecessárias e possa curti ainda mais o seu momento com seu filho, garantindo um sucesso futuro na amamentação exclusiva por seis meses e prolongada por 2 anos ou mais.

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