Já
contei aqui a história de um parto que começa bem, mas por causa de uma série
de intervenções desnecessárias acaba terminado em uma cirurgia abdominal, ou
seja, uma cesariana. Hoje vou contar a história de um parto normal, também
cheio de intervenções desnecessárias e não humanizado. É o que chamamos de “parto frankstein”, mas infelizmente o único
que a maioria das mulheres que conseguem parir no Brasil conhecem (já que 52%
dos bebês nascem por cesariana no país, isso é, as mulheres não tem a
oportunidade de parir.
Nessa
história nossa grávida vai se chamar Joana, mas poderia ser Ana, Maria ou Patrícia...
Qualquer uma de nós.
A
história começa como sempre, uma mulher grávida que conhece pouco sobre o
parto. Conhece apenas as cenas de desespero mostradas na televisão e talvez um
pouco do relato de sua mãe ou tias. O relato da avó, provavelmente é de parto
normal, mas parece algo distante e de outro século, literalmente.
Bom,
Joana confia no seu obstetra, mas não terá seu parto com ele, já que para isso
teria que pagar uma taxa de disponibilidade, algo entre 1500 a 3000 reais. Ela
escolhe então um dos hospitais que seu convênio cobre e é para essa maternidade
que vai quando entra em trabalho de parto, para ser atendida pela equipe de
plantão.
Joana
chega ao hospital sentindo algumas contrações após sua bolsa ter rompido. O
marido faz o registro e a internação da esposa.
Assim
que entra as enfermeiras começam a preparar Joana. Começam pelo procedimentos
de enema e tricotomia. O enema é a
lavagem intestinal da mulher com glicerina. A tricotomia é a raspagem com
gilete dos pelos pubianos da mulher. Ambos procedimentos desconfortáveis e
invasivos para Joana. Ela se sente inibida e constrangida. Mas assume que esses
procedimentos são necessários. O que ela
não sabe é que esses procedimentos são realizados por conveniência médica, uma
vez que já é de conhecimento cientifico que esses procedimentos não beneficiam
o parto e que o pelo da mulher ou mesmo suas fezes não contaminam de forma
alguma o bebê que esta nascendo.
Logo
depois já colocam Joana no soro com
ocitocina. Ela fica deitada na cama sem saber muito o que fazer e como
poderia diminuir a sua dor. As contrações rapidamente ficam mais rápidas e
fortes. Com muita dor Joana pede pela anestesia e recebe uma dose alta de peridural. Com a anestesia
as dores passam, mas o trabalho de parto torna-se longo e demorado. Depois de
algumas horas Joana já está se sentindo fraca
pelo jejum.
Finalmente
a dilatação está completa e o bebê começa a descer. Mas Joana está anestesiada
e não sente o que está acontecendo. Não percebe
a necessidade do seu corpo em fazer força, o puxo.
Joana
é então levada ao centro cirúrgico e colocada em posição de Litotomia, deitada com as pernas para
cima. As enfermeiras dizem a Joana para não gritar e só fazer força. Força
grande, força cumprida! Joana esta exausta e não sabe mais como fazer essa
força. Aliás, o que seria mesmo uma força cumprida?
Logo o
médico faz uma episiotomia, um corte
profundo no períneo de Joana. Esse procedimento é realizado sem o conhecimento ou consentimento de
Joana, e apenas para conveniência médica, uma
vez que já foi provado cientificamente que a episiotomia de rotina é
desnecessária e que, se houver corte, ele cicatrizará melhor se for um corte
natural, que segue a fibra muscular do que um corte profundo e reto, realizado
pelo médico.
A “passagem”
(espaço entre os ossos da bacia) de Joana esta diminuída porque, ao deitar. seu
coxis posiciona de forma anterior, diminuindo o espaço. Além disso, deitada a
gravidade não auxilia no trabalho de parto. Anestesiada Joana também não
consegue fazer mais força. Seu bebê coroa (aparece a ponta da cabeça), mas não
nasce. O médico, impaciente, resolve usar o fórceps
(instrumento usado para puxar o bebê), sem contar a Joana para não assustá-la.
Joana sente muita força e muita pressão. Finalmente o pequeno bebê nasce. Um
tanto assustado e um pouco devagar com os efeitos da anestesia.
Joana
está emocionada. Não percebe tudo o que acontece a sua volta. O pediatra chama
o marido para cortar o cordão umbilical e leva o pequeno bebê para uma
incubadora a parte para ser avaliado. Depois de fazer a sua avaliação o
pediatra entrega o bebê a Joana e pode encerrar o plantão, uma vez que já fez
toda a sua avaliação, pegando o bebê antes da mãe. Avaliações que poderiam ser realizadas depois que a mãe amamentasse,
uma vez que o bebê está bem.
Com o
filho nos braços Joana pode abraçá-lo e beijá-lo. Um pouco sem jeito, por não
poder sair da posição de litotomia, tenta amamentá-lo. Mas o tempo é curto. Não
dá tempo de colocá-lo para sugar ou amamentá-lo. Logo a enfermeira vem buscá-lo
para levar ao berçário e passar por outros procedimentos, enquanto a mãe recebe
os pontos pela episiotomia que sofreu.
Joana
só voltará a ver o filho muitas horas depois, possivelmente no dia seguinte se já
for noite. Vai para o quarto com o marido, sentindo-se disposta, mas ainda com dor de cabeça por causa da anestesia.
Mais tarde, quando seu filho chega ao quarto ele já está dormindo, mas ela
sente-se disposta a amamentar, mesmo com poucas explicações da equipe de
enfermagem.
Felizmente
Joana tem mais condições físicas para amamentar seu filho e já no dia seguinte estará
em casa para poder se dedicar exclusivamente a ele. Infelizmente seu parto foi cheio de procedimentos invasivos e desnecessários,
quando poderia ter sido muito mais tranquilo, amoroso, sem sofrimento e
humanizado. Um parto que propiciaria ela maiores condições ainda de seguir
amamentando seu filho.
Conhece histórias como essa?
Nesses casos, quando a mulher relata o tanto que
sofreu num parto e que a dor é terrível, fica fácil de entender porque não
desejam outros partos vaginais, já que de normal esse não teve nada.
Todos estão bem, mas o desejo de algo melhor
permanece, o desejo de que Joana possa um dia ser a dona de seu próximo parto, sem
tantas intervenções desnecessárias e possa curti ainda mais o seu momento com
seu filho, garantindo um sucesso futuro na amamentação exclusiva por seis meses
e prolongada por 2 anos ou mais.
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