Em
Belo Horizonte temos o privilégio e talvez a sorte de contar com a assistência
ao Parto do Sofia Feldman. Um hospital público, referencia para todo o mundo no
movimento da humanização do parto! Mas, infelizmente em outros hospitais,
especialmente nos privados, a assistência humanizada ao parto não é política do
hospital e sim depende do interesse do obstetra que acompanha a gestante e do
empoderamento da mulher!
As
doulas autônomas incentivam as gestantes a exercerem seu direito e terem seus
filhos no Sofia. No entanto, muitas gestantes e suas famílias ainda tem grande resistência
em frequentar a maternidade, por uma ideia distorcida do atendimento no SUS e
por medo da localização da maternidade, em uma comunidade de baixa renda. Acontece
que aqui na cidade temos apenas um
pequeno grupo de obstetras com os quais podemos contar para defender e exercer
um acompanhamento humanizado durante a gestação e parto.
Quando
digo humanizado me refiro a um profissional que entenda que a mulher é a
protagonista do parto, que a auxilia no seu empoderamento ofertando informação
e acolhimento, e que jamais a induza a uma cesariana desnecessária ou a submeta
a um parto cheio de intervenções desnecessárias e ultrapassadas cientificamente.
E
dentre esses profissionais a maioria são homens. Não consegui encontrar um dado
que ateste se a proporção de obstetras homens e mulheres em BH ou no Brasil,
então não sei se as mulheres médicas obstetras estão afastadas apenas do
movimento de humanização ao parto em BH ou se temos mesmo mais homens do que
mulheres na obstetrícia. Mas esse fato tem criado situações desconcertantes
entre gestantes empoderadas! Esse ano já acompanhei duas que trouxeram essa
questão.
Decidiram
ter seu parto no Sofia Feldman, no entanto, desejam continuar o pré natal com
um profissional de seu plano de saúde. Mas, não querem ser acompanhadas por
qualquer profissional. Querem ser bem assistidas, sem ter que passar toda
gestação desconfiando se seu médico está ou não falando a verdade e se não vai
inventar algo que mine a sua confiança e te induza a uma cesariana
desnecessária.
Acontece
que essas mulheres não se sentem confortáveis com um obstetra homem. E ai a
procura por uma obstetra mulher, que tenha esse perfil e seja do seu plano de
saúde, torna-se mais difícil ainda. Pior do que procurar uma agulha em um
palheiro!
Fiquei
muito intrigada com essa situação! Não da falta de obstetras mulheres, mas da
dificuldade de mulheres empoderadas e informadas serem cuidadas por um obstetra
homem. É verdade que os exames realizados e os assuntos discutidos são muito
íntimos, no entanto, se procuramos um profissional capacitado não deveria
importar seu gênero.
O que acontece então!?
Será que eu aceitaria um obstetra homem?!
Não
sei ainda como me comportaria. Isso porque sou também fruto desta nossa
sociedade machista, onde nos acostumamos ao fato de que até profissionais de
saúde, durante uma consulta, sentem se livres para violentar uma mulher. E na
cultura do medo e da culpabilização da vítima, nós mulheres somos ensinadas
desde pequenas a nos proteger, fugindo de situações que tem o potencial de ser
perigosas, ou seja, de nos colocar em uma situação vulnerável onde o homem pode
nos violentar.
Violentar?! No obstetra?!
Alguém
pode estar se perguntando sobre isso! Ou achando o texto ridículo! Ou achando
que estou falando de casos absurdos e exceções extremas!
Não!
Estou falando de questões que cercam o nosso dia a dia. Estou falando do nosso
medo que foi fantasiado como pudor e educação!
Estou
falando da violência obstétrica a que a mulher está sujeita antes, durante e
depois do parto.
Estou
falando da certeza da impunidade que os homens que praticam essa violência têm
e que faz com que nós mulheres façamos a transferência do medo para todo e
qualquer homem, mesmo que nunca tenha praticado nenhuma violência contra a
mulher.
Estou
falando do fato de nem sequer conseguirmos reconhecer essa violência obstétrica,
que é encoberta como a frieza e profissionalismo ou algo normal para um homem.
Estou
falando dos maridos das mulheres que não aceitam que se consultem com obstetras
homens. Dizemos que são machistas, e são, mas também estão seguido seu instinto
protetor. Querem proteger as mulheres que amam de passarem por uma humilhação
que tem certeza que os homens são capazes de fazer e consideram com um
comportamento normal
Além
do abuso sexual físico, temos medo de sofrer o abuso sexual psicológico e a
humilhação pública. Temos medo dos comentários cínicos que vamos ouvir. Temos
medo das piadas sem graça que transformam as mulheres em objetos sexuais. Temos
medo dos comentários desrespeitosos que serão realizados depois entre médicos e
amigos.
E ai?! Até quando vamos continuar aceitando
essa situação?! Até quando vamos continuar com medo de sermos violentadas por
profissionais da saúde que deveriam zelar pelo nosso bem estar?!
Enquanto
ficarmos caladas e não aprendermos a apontar cada uma das violências que nos
mulheres sofremos por sermos mulheres, a situação não começará a mudar!
Nenhum comentário:
Postar um comentário